O texto que segue foi produzido por mim, na primeira aula de Leitura e Produção de textos 1, com a Profª Drª Maria Aparecida Resende Ottoni. A proposta era a produção de um texto de autoapresentação que rompesse com a estética costumeira.
Um dragão mora comigo. As oscilações de meus sentimentos me confundem e me incomodam, não como se ele morasse comigo, mas como se ele morasse dentro de mim. Não tenho o direito de me sentir ofendido ou agredido: se ele mora comigo, foi por eu ter permitido. Vezenquando, o fogo que sai das ventas do dragão-que-mora-dentro-de-mim me corrompe, me queima e destrói todo o meu interior e tudo em que eu acredito.
Na minha mente cheia de obscuridades, insanidades e esquisitices, mantenho em um lugar bem clarinho a doçura de minha mãe, que desde cedo me despertou o interesse pela leitura e escrita. Tenho poucos amigos e raras notícias de meu pai. Recebo constantes ligações de meus avós paternos, talvez como uma forma de desculpa pela ausência de quem, teoricamente, deveria se preocupar comigo.
Só percebi a quietação do dragão uma vez. Uma única vez: depois da notícia de minhas aprovações em quatro universidades federais. Antes de receber os tais comunicados ele me agredia demais, se debatia e sua cauda conseguia até alcançar a boca de meu estômago. Quando o tal bicho está tranqüilo, exala um aroma aveludado de almíscar; já quando é o mal-humor que toma conta, não consigo descrever que cheiro sai. Acredito que o meu interior é o habitat perfeito para esse animal, com esse comportamento. Porém, para os dragões, harmonia nunca é aceitável, eles gostam de conflito, desconforto, da dor (aguda e crônica), da insatisfação, das trevas, da desilusão.
Busco aceitação e amor no coração. Em todo tipo de relação (de amizade, amorosa ou as outras que acabamos por tecer), busco alguém que me incite e que me faça querer ser cada vez melhor. Não desejo relações fáceis e simples de se compreender, quero o complicado e o de pouco acesso. Porque me canso do fácil, me canso de pisar no bom e velho piso. Quero mudança, revolução, idéias novas, bandeiras levantadas. E o dragão também quer. Quero janelas novas, pisos e paredes diferentes. E o dragão também quer. O tal dragão me provocará eternamente e eu nunca poderei ver a estréia triunfal dele, ele simplesmente de-sa-pa-re-ce quando eu mais preciso mostrá-lo, exibi-lo. Quando mais preciso mostrar a minha força e coragem. Quando eu preciso soltar o fogo que vem das ventas dele e que, constantemente, aquecem a região da minha nuca.
O jornalismo é uma paixão insaciável, minha e do dragão. O jornalismo se alimenta dos imprevistos da vida, eu e o dragão também. Eu e ele queremos viver as emoções da notícia, do furo e, educando através da comunicação social, pois é necessária extrema responsabilidade. A profissão é árdua e não concede um instante de paz enquanto não informa, não educa e não acrescenta. Tive dezoito invernos extremamente bem vividos e agradeço a Deus pelo clima da estação ser diferente do meu emocional. Aqui, dentro de mim, apesar da existência do dragão, brilha intensamente um sol, um sol que alivia, traz paz e permite as brincadeiras matinais, vespertinas ou noturnas do dragão.
